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Monday, August 06, 2007


Literatura de cordel: história e memória do Brasil

Neuza A. S. Mello[1]

A literatura de cordel é uma manifestação cultural, rica em estrutura, personagens e narrações, muito comum no norte e nordeste do país. De acordo com Curran (1991, p. 9), este tipo de literatura existe no país provavelmente desde o século XVI e XVII, quando “trazida pelos colonizadores portugueses”. Com o decorrer do tempo sofreu influências regionais e no século XIX assumiu a forma utilizada até os dias de hoje.

Embora esta literatura tenha se fixado mais no norte e nordeste do Brasil, ela não se restringiu a estas regiões, com o processo migratório, atingiu diferentes localidades do país e obteve certa consagração na década de 50.

De acordo com Almeida (1980, p. 35), a junção entre forma escrita e oral aliada á linguagem contextualizada com a vivência regional, agradava ao público e rendia sucesso ao cordel, o que também contribuía para que o mesmo fosse empregado de forma ideológica, embora não se vinculasse a grupos e sim a criadores individuais.

“Enquanto Suassuna utilizava o folheto como voz “popular” dirigida a um público nacional e culto, em 1959 é publicado um trabalho onde as virtudes pedagógicas dos folhetos são avaliadas, pensando-se neles como meio de incutir ao homem do campo noções modernas (higiene etc.) e ao mesmo tempo “orgulho” pelas suas tradições (tratava-se de frear o êxodo rural)”
(Almeida, 1980, p;. 35)

Por meio dos cordéis, os poetas expressavam o pensamento popular e sua visão de sociedade, a qual não poderia ser diferente, por vezes conflitante, o que rendeu a seus autores até mesmo perseguição política.

Nos anos que se seguiram, a modernização do país em conjunto com a crise econômica, contribuiu para a decadência da literatura de cordel. Embora tenha se criado um novo público neste período, formado por pessoas advindas de outras classes sociais, o cordel perdeu expressão, porém ainda permanece vivo e nos serve como inspiração no que se refere à comunicação de idéias.

A literatura de Cordel além de ser um instrumento de expressão e comunicação de idéias, tem se mostrado como um instrumento de questionamento e de registro da própria história do país. Por meio dos folhetos, as localidades mais remotas recebiam informações sobre acontecimentos relevantes do país e sobre os mais diversos assuntos. Estes folhetos tinham como característica a postura crítica de seus autores.

Em entrevista recente o ator e cantor brasileiro Jackson Antunes, de origem mineira, destacou a importância da literatura de cordel na sua formação pessoal, ele relembrou que na sua região de origem o acesso à informação era restrito e que as pessoas com menor poder aquisitivo, a exemplo dele próprio, só tinha acesso aos acontecimentos por meio da literatura de cordel. Tais relatos confirmam o argumento de que dentre as diversas contribuições da literatura cordel, destaca-se sua importância como instrumento de registro histórico, contribuindo com a informação e formação de várias gerações.

Dentre os diversos autores que se dedicaram e ainda se dedicam a Literatura de Cordel, destaca-se dentro da perspectiva histórica e crítica o cordelista Gonçalo Ferreira da Silva. Embora, este autor tenha se destacado pela abrangência dos temas que aborda, o mesmo escreveu diversos cordéis sobre temas políticos, registrando momentos importantes da história recente.

Dentro da linha política destaca-se temas como:

Procura-se um presidente para o lugar de Sarney;
Getúlio Vargas;
Inglaterra e Argentina em guerra pelas Malvinas;

Além de registrar momentos importantes da política nacional e internacional em seus versos, o autor também registrou momentos que marcaram significativamente outros campos, como o esporte e a música, cordéis como "A morte de Senna" e o "Acidente que matou os Mamonas" fazem parte da produção do autor e representam o grande interesse deste pelos fatos importantes da nossa história.

Além de Gonçalo Ferreira, outros autores também se dedicaram a cordéis sobre temas históricos. Antonio Carlos Carvalho da Silva, Luis Melo e Eronilde de Oliveira Rosa são exemplos de autores que abordaram em seus cordéis aspectos da história regional.

Estes e outros cordéis sobre temas históricos podem ser encontrados na Biblioteca Central da Universidade Estadual de Londrina e a leitura dos mesmos nos dá a dimensão da contribuição que deste tipo de literatura deu e ainda pode dar ao país quanto ao processo de informação e formação das gerações.


REFERÊNCIAS


CHARTIER, Roger. A história cultural. RJ. Bertand Brasil, 1985 (cap. VI pg. 165 – 187).

CURRAN, Mark J. A literatura de cordel: Antes e Agora.

Universidade Estadual de Londrina. Biblioteca Central. Literatura de Cordel: catálogo do acervo da Biblioteca Central da Universidade Estadual de Londrina/ organização Gisele Helena dos Santos Silva, Izabel Maria de Aguiar e Francisca Sancevero. – Londrina : Ed. Da UEL, 1997.

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[1] Docente do Departamento de Educação, Universidade Estadual de Londrina – Integrante do Grupo depesquisa em Literatura de Cordel – Email: nasmello@yahoo.com.br

Sunday, August 05, 2007

LITERATURA DE CORDEL PARA CRIANÇAS

Izabel Maria de Aguiar

Alguém pode estar se perguntando: o que é mesmo cordel? Então vamos começar pelo início. A denominada Literatura de Cordel ou os Folhetos de Cordel são um tipo de poesia narrativa e popular, escrita em versos rimados e metrificados, geralmente impressos em papel jornal, no tamanho usual de 11cm X 16cm. Possui número variado de páginas, sempre múltiplas de 4, em geral 8, 16, 32, 48 ou 64 páginas. Seus versos contam histórias do reino do encantado, do boi misterioso, de valentia, política, fatos reais... De origem portuguesa, este modelo de literatura expandiu-se, e hoje tem público garantido, fiel às formas fixas da poesia que se apresenta em um formato editorial singular. Muito consagrado no Nordeste brasileiro, os folhetos são respeitados em todo o mundo por ser uma espécie de elo vivo entre a história contemporânea e a medievalidade européia dos trovadores.
Constatamos hoje, que a literatura produzida para crianças conta com uma grande variedade de gêneros e temas em suas publicações, e que o contato com diferentes suportes de leituras (livros, jornais, revistas, Internet, etc.) e com variados gêneros e modalidades textuais, tornarão os leitores iniciantes, mais aptos para a leitura do mundo e da palavra.
Dentre os diferentes suportes de leitura, temos a literatura de cordel. E entre alguns autores que se dedicam ao cordel infantil, vamos falar sobre Raimundo Santa Helena, por ser ele o primeiro poeta a escrever um cordel infantil.
Depois de mais de 430 folhetos de poesia de cordel publicados em diversas línguas, o cordelista Raimundo Santa Helena resolveu investir na formação de novos leitores.
Em 1984, escreveu o primeiro cordel infantil. Depois de escrito, o autor conta que mostrou os originais datilografados ao poeta Carlos Drummond de Andrade. É costume que os cordéis só tenham uma ilustração, geralmente uma xilogravura: a da capa. Mas Drummond aconselhou Santa Helena a publicar o folheto de cordel com uma xilogravura por página. Sugeriu que não fossem usados desenhos de livros infantis e sim as imagens talhadas em madeira, como manda a tradição. Apesar da vontade, o cordelista não podia arcar com os custos das várias xilogravuras que pretendia colocar no folheto. Lançou então, em uma produção artesanal, 6 mil exemplares da 1a edição, com desenhos de Ênio Mota.
O relançamento com novo formato, ilustrado com xilogravuras e não desenhos, só foi possível quando a Editora Entrelinhas se prontificou a publicá-lo.
"O menino que viajou num cometa" é uma delicada preciosidade para as crianças e adultos. Cita personagens históricos, como Joana D'Arc e Tiradentes, e fala de Saúde, de Astronomia e da igualdade entre homens e mulheres. Mas, independente do seu caráter didático, traz uma divertida história de Brasilenho, menino que pega uma carona celeste e como "anjo foguete" chega à lua.

"Sou chamado Brasilenho
Meu nascimento se deu
Num campo de futebol
Quando meu time venceu
E mamãe pulou buchuda!
Numa bandeira graúda
O papai me protegeu..." (p.5)

Você que saber mais? Ah! Você vai ter que ler para saber o final da história!!!

Link para o cordel na íntegra: "O menino que viajou num cometa" de Raimundo Santa Helena - http://www.museudofolclore.com.br/

A Biblioteca Central da UEL possui a 1a edição, com desenhos e não xilogravuras.

Artigo publicado em setembro de 2004 na coluna Literatura Infanto-Juvenil de Sueli Bortolin, no endereço: http://www.ofaj.com.br/
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Izabel Maria de Aguiar - Bibliotecária da Biblioteca Central da UEL e integrante do Grupo de Pesquisa em Literatura de Cordel - mailto:aguiar.uel.br.